terça-feira, 25 de outubro de 2005

A única fórmula filosófica do mundo "é"

by sandra fasolo
_embalada pela simpatia-riobaldiana_

A única questão filosófica no mundo, segundo Albert Camus, é suicidar-se ou não. Passado. Esse tipo de papo-cabeça já cansou faz tempo. Só os velhos continuam repetindo fórmulas vencidas. O século XX tem um legado de morte, morte de deus, morte da metafísica, morte do sujeito, morte da obra de arte (devido à reprodução) e por aí vai. Os "pensantes" deram um jeito de dar um fim em tudo com a tal de consciência de finitude, morte da consciência também, já ia esquecendo. Em certo sentido, tornada passado já não é mais a mesma_ vamos dar um desconto. Nada suave esse tal de século XX onde a fórmula por excelência se constituía em: a única forma de alguma coisa existir é X. A Vida se resumiu a uma determinada fórmula possível. Uma única que deveria ser adotada por todos os seres humanos. Que absurdo. A única forma de se fazer filosofia hoje é através da linguagem. Este é um bom exemplo de uma das utilizações da forma de matar quase tudo reduzindo a Vida à uma sentença/premissa/afirmação, enfim, a definição nem importa aqui. Deixaram uma saída, provavelmente para não cair na última, a de Camus. Que limiar este para um filosofar insano que pretende matar aquilo que finge cultuar: a Vida. Não é à toa que as pessoas do século XX são as mais pessimistas e sisudas de todos os tempos. Antigamente se diziam coisas mais fortes, mas havia ainda um algo lúdico, uma certa vida, um certo sim à Vida em forma de prazer ou além disso, de amor pelo que se defendia. Hoje em dia é difícil encontrar alguém que diga estar na filosofia por amor à filosofia, em geral, significa trampolim para encher os bolsos de grana e um intelecto limitado em alguma fórmula de vaidade. Não é ridículo? Para não dizer insano. Deve ser o uso não-ético da fórmula. Estes deveriam pensar na única questão filosófica camusiana. Cruel? Mas nem tanto. Raciocinar em cima de uma única possibilidade como é bem próprio dos filósofos do século XX com seus pressupostos únicos é, no mínimo, reduzir a si mesmo a argumentos "únicos". É só dar uma olhada em tais pressupostos. Voltar às coisas mesmas: única fórmula possível de Husserl, de pensamento e de vida, pois se a consciência é o fundamento da vida de qualquer ser humano e o viver depende de atos oriundos dela, então, o viver se inclui aí. O dasein heideggeriano, única fórmula possível de vida: o estar-aí, como se não fosse importante estar também antes, depois, entre, muito depois, além, etc. Única fórmula sartreana: a existência precede a essência, como se o ser humano só passasse a ter alguma essência a partir do momento em que tivesse consciência de sua existência somado ao fato de que está fazendo algo por ela, então tem direito a uma essência. Talvez só os velhos tenham a tal essência sartreana. Witt, única fórmula: a linguagem. É interessante esse jogo da única fórmula. Pior que na Academia Filosófica continuam com isso como se fosse algo extremamente genial que seres humanos que estão de fora da filosofia não tem capacidade de entender. Mas se é assim, aprender a viver na limitação da única fórmula, os que estão de fora da filosofia perdem alguma coisa? Pelo contrário, são mais ricos e com um mundo existencial mais diversificado porque não ficam pensando durante 50 anos com uma mesma sentença viciada dentro da mente. Não é limitado isso? Pegar uma afirmação e ficar derivando todo o resto em cima de uma única fórmula. Este é o meu conceito para dogmatismos acadêmicos. Por isso gosto de “brincar” com várias fórmulas. Num dia faço literatura com Husserl. No outro dou uma de racional com Bachelard. No outro entro em contradição falando sobre sensações imutáveis. No outro rezo e invoco Nietzsche para no dia seguinte louvar a Platão num monólogo sem ponto sem vírgulas passando para um fluxo de consciência aristotélico. No mês seguinte tenho certeza de que sou empirista e adoradora de certezas de que se ontem aconteceu X, hoje também irá acontecer. Para então pensar que os malditos é que tinham toda a lucidez deste planeta, já que no simbolismo não existe uma fórmula última, não há controle sobre os sonhos e o imaginário e aqui regras são tidas como morte À Vida. Tudo menos reduzir a vida a fórmulas, principalmente se for a última. Isso chega a ser hilário porque há um circular de pessoas que defendem sua única fórmula como se fossem salvar o mundo. Mas o mundo deseja vida em grande estilo, o mundo deseja vida verdadeira e intensa e diversificada. Falando nisso, a mania de reduzir a multiplicidade em uma unidade de onde tudo deve derivar prova a busca insana da única fórmula. Sistema = fórmula única = limitação de vida e de pensamento. Acredito nos filósofos que misturam de tudo um pouco, que se contradizem, quanto mais contradição mais vida. Quanto mais contradição menos limitação. Quanto menos contradição mais limitação. O mais engraçado é que a pedra no sapato de quem estuda filosofia é não cair em contradição, caiu em contradição com seu discurso está ferrado intelectualmente. Não deveria ser o contrário? Kierkegaard já dissera que a paixão do pensamento é o paradoxo. Acho que ele se salva da única fórmula junto com Nietzsche e outros seres criativos que passaram por aqui. Também Platão, que de contradição em contradição mostrou que a coisa mais frágil é a capacidade de afirmar algo com absoluta certeza para no instante seguinte ver que não era nada disso, pois apenas uma pergunta a mais pode instalar a dúvida e retirar toda a certeza que antes havia no pensamento. Talvez o melhor ensinamento de Platão tenha sido este: permita-se cair em contradição com uma pergunta atrás da outra alternada com respostas, a dialética é um hino de louvor à contradição, portanto, à Vida. Alguns poderiam dizer: se isso for levado aos extremos a vida não seria possível, cairia num estado de não-racionalização tal que inviabilizaria a vida. Mas a vida é sábia e não considera que as contradições sejam tão importantes a ponto de ter poder de acabar com a Vida no mundo. Essa é mais uma fórmula sofista da filosofia em dose única.

Esse texto também é em dose única, principalmente com a inversão dos exemplos dados do uso que faço dos filósofos. C'est la vie.

Anna K & A fórmula do dia seguinte