terça-feira, 30 de agosto de 2005

Pré-socráticos

1. Quais as principais questões que orientaram o pensamento da Escola de Mileto? Poderia-se aqui, abranger diversos aspectos no que se refere ao termo ‘questões’, como o político, o religioso, o mítico, o literário, o social, o antropológico, etc., em que sentido exato se deveria procurar tais questões? Optou-se, portanto, pelo termo como sendo uma relação direta apenas com o pensamento filosófico dos jônicos. As questões teóricas ou as especulações científicas que Tales, Anaximandro e Anaxímenes, começaram a desenvolver podem ser analisadas por dois caminhos. Existem duas linhas de interpretação para o início da Filosofia na Grécia e como a Escola de Mileto foi a primeira a fazer filosofia após a época mito-poética de Homero e Hesíodo, não se pode separá-los do começo da Filosofia. Estes dois caminhos apontados por historiadores, filósofos, antropólogos e arqueólogos se dividem em uma interpretação ‘ocidentalista’ ou ‘orientalista’. Se considerarmos a primeira, os historiadores e filósofos, afirmam que o berço da filosofia é a Grécia, que o Helenismo como diz Werner Jaeger, ‘ocupa uma posição singular, a Grécia representa, em face dos grandes povos do Oriente, um progresso fundamental, um novo ‘estádio’ em tudo que se refere à vida dos homens na comunidade. Esta fundamenta-se em princípios completamente novos. Por mais elevadas que julguemos as realizações artísticas, religiosas e políticas dos povos anteriores, a história daquilo a que podemos com plena consciência chamar cultura só começa com o Gregos.’ Se considerarmos a segunda linha de interpretação, teríamos que estudar a fundo questões que antecedem os gregos e que pertenceram a povos mais antigos e com uma cultura bastante diferenciada, teríamos que, antes de procurar as questões gregas, buscar o pensamento Egípcio e o Mesopotâmico, o Hindu, o Chinês, o Fenício, etc. A base do pensamento do Oriente como Confúcio, Buda e Zoroastro, se é que existiram, como coloca Russell, pertenceram ao final do mesmo século de Homero e, portanto, foram anteriores aos primeiros filósofos gregos. Assim, caso se acreditasse nesta tese, as questões remeteriam a uma análise embasada no ‘orientalismo’ e no que foi a cultura de povos que também pensaram o universo. Russell, no prefácio de sua obra Filosofia Antiga, terceiro parágrafo, diz que: (...) ‘Os filósofos são, ao mesmo tempo, causa e efeito: efeito de suas circunstâncias sociais e da política e instituições de sua época; causa de crenças que modelam a política e as instituições de épocas posteriores. Na maioria das histórias da filosofia, cada filósofo aparece como se estivesse no meio de um vácuo; suas idéias são expostas sem conexão, exceto, quando muito, quanto ao que se refere aos filósofos anteriores. (...) No caso da Escola de Mileto, estes filósofos (Tales, Anaximandro, Anaxímenes) foram o ‘impulso’ para que a Filosofia começasse a se desenvolver verdadeiramente. Como causa, pode-se dizer que impulsionaram o filosofar ocidental, pensaram racionalmente as primeiras hipóteses sobre a explicação do universo, sobre a origem, sobre uma unidade que tudo viria sustentar e que chamaram ‘arkhé’; como efeito, influenciaram e serviram de base e questionamentos futuros para outras hipóteses de filósofos posteriores. Anterior à Escola de Mileto, temos Homero e Hesíodo, os quais não escreveram em prosa e não foram filósofos no sentido real da palavra, pois as suas narrativas, apesar de poderem ser abstraídas sob diversos aspectos, são mito-poéticas e não possuíam uma intenção de procurar de forma racional o princípio do universo. Por isso, estes filósofos de Mileto, converteram-se no ponto inicial da Filosofia Ocidental. Mas, o que teria influenciado o pensamento de Tales, Anaximandro e Anaxímenes? Segundo Russell torna-se difícil explicar o aparecimento da civilização grega. Milhares de anos antes, já existia a civilização egípcia e mesopotâmica. Porém, o que os gregos realizaram no campo puramente intelectual não o fizeram influenciados por ‘ortodoxias’ herdadas. Essa nova mentalidade que surgia através de especulações podem ser consideradas como hipóteses científicas, porque os problemas levantados, as questões formuladas pensavam não só o ‘arkhé’, pensavam, na verdade em uma nova forma de olhar para o mundo, principiava um pensar abstrato que viria a ser o berço da filosofia e da ciência teórica ocidental iniciada pelos filósofos de Mileto e inspirando os filósofos subsequentes a eles. 2. O que significa científico nesse contexto? Quando a Filosofia surgiu, no século VI a.C., não estava separada da Ciência tal como a vemos hoje. ‘Científico’, nesse contexto dos jônicos, refere-se a formulação de hipóteses racionais sobre a origem do universo, é um ‘científico metafísico’, pois a preocupação com um princípio que viria tudo sustentar foi um dos primeiros problemas colocados pelo homem. Fazer ciência era ‘pensar o mundo’ e pensar através de uma nova mentalidade que surgia. Os Pré-Socráticos. Fragmentos. Doxografia e Comentários. 1. Do mito à Filosofia Primeiramente, o que vem a ser mito na época de Homero e Hesíodo? De que forma pode-se buscar a função de um mito em uma determinada época e cultura? O que representava os mitos gregos para os próprios gregos? De que forma influenciaram suas vidas e seus pensamentos? O mito começou a ser substituído aproximadamente no século VI a. C., quando a Grécia iniciou as investigações científicas e especulações filosóficas. Mas qual foi o ponto de partida para uma nova mentalidade que surgia? Existem duas teses a esse respeito: a dos ‘orientalistas’, a qual atribui-se ao Oriente a condição de fonte originária da tradição filosófica que os gregos teriam apenas continuado e expandido e as dos ‘ocidentalistas’, que atribuem à Grécia o berço da filosofia e da ciência teórica. A questão principal da origem histórica da filosofia está na compreensão de como se processou a passagem entre a mentalidade mito-poética e a mentalidade teorizante. ( o que significa ‘conquistas esparsas e assistemáticas da ciência empírica e pragmática dos orientais?) O nascimento da epopéia O homem grego encontra sua primeira expressão através das epopéias as quais incorporaram relatos mais ou menos fabulosos (...) entremeando lendas e ocorrências históricas, surgem cantos e sagas que os aedos continuamente vão enriquecendo. As guerras de Tebas e a Guerra de Tróia são os maiores exemplos disso. Mas desses numeroso poemas, apenas dois se conservaram: a Ilíada e a odisséia de Homero, escritos entre o século X e o VIII a.C. (Se sobraram somente as obras de Homero como sabem que haviam outros numeroso poemas?, por dedução ou por provas arqueológicas? Não poderiam estes numerosos poemas constituírem a obra total que atribuem a Homero? Como alguém poderia escrever algo que levou 200 anos para ser escrito?) Tempos de Deuses e heróis As obras de Homero: além de informar sobre a organização da pólis arcaica, as epopéias homéricas são a primeira expressão documentada da visão mito-poética dos gregos. A presença de ‘deuses humanizados’com poderes superiores está em toda a obra de Homero. Na Ilíada, que narra a Guerra entre gregos e troianos ou na Odisséia que narra as aventuras de Ulisses ou Odisseu. A arkhé dos primeiros filósofos pode ser vista também em Homero se observarmos que existia uma unidade entre os deuses, comandada por Zeus, o que pressupõe uma ‘ação ordenada’por parte dos deuses, chegando a admitir uma certa unidade na ação divina, onde pode ser inferido que subjaz uma noção de ordem, de hierarquia, de unidade que mais tarde será a principal preocupação dos pré-socráticos. Os homens e os divinos imortais Os deuses homéricos escapam à velhice e a morte em oposição aos outros personagens, isto é, aos humanos mortais. Em Homero a noção de virtude (areté) indica a superioridade de seres não-humanos, só algumas vezes identifica areté com qualidades morais ou espirituais. O Reino do Hades exclui para os mortais que se renda culto aos que morrera, pois é de tal forma descrita que afastam o temor dos mortos, o que importa é a vida presente. ( este aspecto estaria mais próximo dos babilônicos e em oposição aos egípcios que tiveram uma visão do ‘além’ de um culto aos mortos bastante acentuada, caso fossemos procurar alguma influência dos povos anteriores) O personagem Ulisses ou Odisseu que retorna à pátria depois de vencer inúmeros perigos e tentações seria o símbolo dos esforços que a alma humana teria de realizar para voltar à sua essencialidade. Se tomarmos as obras de Homero nesse sentido, não tão descritivo e de ações heróicas intermináveis, mas como uma metáfora da existência humana, poderíamos interpretar as aventuras de Odisseu, em mundos desconhecidos, como a própria busca do homem em compreender-se ontologicamente (o seu próprio ser), onde o aventurar-se, o além-mar, os perigos externos, seriam vistos através de uma eterna procura de nossa ilha perdida que, na verdade, representa o ser e o seu desvendar-se e do desvendar de novos mundos, que não necessitam como no caso de Odisseu, serem externos e em terras distantes, pois a terra mais distante que pode haver é o caminho que precisamos percorrer para dentro de nós mesmos, sabendo que estaremos sempre procurando voltar à nossa essencialidade, a nossa ‘Itaka’ que a cada um pertence e sempre anseia por abandonar e retornar. ( Qual era a visão dos gregos do tempo de Homero?, isto é, o que pensavam a respeito da Ilíada e da Odisséia? Acreditavam, por exemplo, no Hades? Na existência de inúmeros deuses humanizados? Tinham algum tipo de abstração que ultrapassasse a mera narrativa das aventuras? Homero os fazia refletir (dobrar-se sobre si mesmos?) ou era uma espécie de ficção e só servia de passatempo para eles?) No começo, o Caos No início do processo de racionalização da cultura grega, entre Homero e as primeiras formulações filosóficas e científicas dos pensadores de Mileto, Samos e Efeso, situa-se a obra poética de Hesíodo. Com Hesíodo surge a subjetividade na literatura. Os mitos criados por ele tem a função de justificar a condição humana e estão carregados de pessimismo (o primeiro niilista?). O Mito de Pandora, por exemplo, tem a intenção de mostrar que nada mais resta aos homens em sua condição humana a não ser a esperança que, no entanto, encontra-se presa por desejos divinos e que representaria a possibilidade de algo novo. Talvez daí, também sua visão pessimista, a esperança pressupõe um ‘esperar’ de algo que seja diferente ou novo diante do algo que se tem no presente, como uma espécie de possibilidade ou de um vir-a-ser que estaria sendo negado pelos deuses, já que a ‘esperança’ encontra-se inacessível e inalcançável humanamente, por isto o pessimismo de Hesíodo talvez possa ser visto como uma ‘possibilidade’ negada por forças divinas, onde o homem nada poderia fazer para alterá-las. Com Hesíodo surge a noção de que a virtude (areté) é esforço e a de que o trabalho é o fundamento da justiça. Inaugura a corrente de pensamento moral que irá alimentar mais tarde a meditação filosófica. Os Pré-Socráticos As especulações iniciam com a Escola Jônica (Tales, Anaximandro e Anaxímenes) e apesar dos ‘arkhés’destes filósofos e dos posteriores a eles terem sido definidos diferenciadamente, a preocupação em explicar o universo, não mais como um processo mito-poético, mas através da elaboração racional do pensamento, foi comum a todos os pensadores pré-socráticos. A busca de uma ordenação, de um princípio que viria tudo sustentar, foi pensado pela Escola Jônica, pela Pitagórica e pela Escola de Eléia. A partir do século VI a.C. a construção mito-poética cedeu lugar a uma nova e mais radical forma de pensamento racional, que não partia da tradição mítica, mas de realidades apreendidas na experiência humana cotidiana. Uma nova mentalidade que coordenou racionalmente os dados da experiência sensível. dentro desse espírito surgiram na jônia as primeiras concepções científicas e filosóficas da cultura ocidental, propostas pela Escola de Mileto. Propuseram sucessivas versões de uma física e de uma cosmologia constituídas por diferentes princípios. Tales de Mileto: a água era a origem de todas as coisas. Aristóteles diz que teria tido início com Tales a explicação do Universo através da ‘causa material’. Historiadores modernos: atribuem a Tales uma preocupação de cunho metafísico. Paul Tannery: Tales foi importante apenas como introdutor na Grécia de noções da matemática oriental, que ele mesmo desenvolveu e aperfeiçoou, e de mitos cosmogônicos, particularmente egípcios, que laicizou, dando-lhe sustentação racional. (que mitos seriam estes?) Olf Gigon: o surgir da água significaria um processo geológico, sem acepção metafísica. Alguns intérpretes: ‘tudo está cheio de deuses”, representa não um retorno a concepções míticas, mas simplesmente a idéia de que o universo é dotado de animação, de que a matéria é viva. O fato é que um dos aspectos fundamentais da mentalidade científico-filosófico inaugurada por Tales propõem uma nova visão de mundo cuja base racional fica evidenciada na medida mesma em que ela é capaz de progredir, ser repensada e substituída. Anaximandro O princípio seria o ápeiron que se pode traduzir como infinito e/ou ilimitado. Estaria animado por um movimento eterno, que ocasionaria a separação dos pares de opostos que ao longo do tempo pagariam entre si as injustiças reciprocamente cometidas. Para alguns intérpretes isso significaria a afirmação da lei do equilíbrio universal, garantida através do processo de compensação dos excessos ( por exemplo, no inverno o frio seria compensado dos excessos cometidos pelo calor durante o verão). (Não influenciou Heráclito?) Anaxímenes Foi o último representante da Escola de Mileto e para ele, o universo resultaria das transformações de um ar infinito. A salvação pela matemática Pitágoras de Samos, realizou uma modificação fundamental na religiosidade órfica, transformando o sentido da ‘via da salvação’: no lugar de Dioniso colocou a matemática, os números seriam a ‘alma das coisas’. Até aqui houve preocupação em buscar e definir a ‘arkhé’ por meio de uma physis corpórea. com a Escola de Eléia iniciam as especulações da lógica e da ontologia, ou seja, sobre o conhecer e sobre o ser. Temos aqui diversos pensadores: Xenófones, Parmênides, Zenão, Heráclito, Melisso, Empédocles, Anaxágoras, e, depois, os atomistas representados por Leucipo, Demócrito. Questões: O autor diz que a partir da afirmação de Xenófanes, ‘Um Deus é o supremo entre os deuses e os homens; nem em sua forma, nem em seu pensamento é igual aos mortais’, começa o combate aos deuses antropomórficos, herdados da tradição homérica. Mas, isto já não estava acontecendo a partir dos Jônicos? O que significa apresentação aforismática do pensamento de Heráclito e estilo intencionalmente sibiliano? O que significa estilo oracular nos fragmentos de Heráclito? Quais são as características de um estilo assim? O autor diz que a grande descoberta de Heráclito teria sido a harmonia oculta das forças opostas. Mas isto não estava, de certa forma, em Anaximandro quando ele fala que os opostos pagam entre si as injustiças cometidas?