sábado, 15 de outubro de 2005

Da razão pela qual

Da razão pela qual o Outro [não-ser] não pode ser uma forma significando «falsidade_erro_opinião falsa_discurso falso». Nosso pressuposto é o de que Platão não coloca o Outro como falso, as formas relativas e sua associação mútua ou não é que derivam em falsidade no pensamento, a falsidade não está entre as Formas e não é ela mesma uma Forma. Poderíamos colocar a hipótese a seguir a partir mesmo deste raciocínio, mas para que contenha um peso maior vamos formulá-la ao contrário, como se quiséssemos dizer que o Outro é a Forma do falso: O Outro é uma Forma que diz ou significa o falso enquanto sua essência própria. Passagem Sof. 240d A arte dos sofistas é uma arte ilusionista e nossa alma se forma de opiniões falsas em consequência de sua arte (que está entre as produções humanas e não entre as divinas como consta no final do diálogo). Se o Outro é o Falso como essência decorre que: a produção de opiniões falsas seria uma arte divina e não humana, espécie em que o sofista é enquadrado em 235b. Conclusão nessa passagem não se pode admitir o falso como Forma, pois se a arte humana dos sofistas é a responsável pelas opiniões falsas que se formam na alma, logo não é divina, portanto, não estaria entre as Formas, mas entre o logos produzido pela espécie humana sofista que se encontra no sensível. Passagem Sof. 240d A opinião falsa é aquela que concebe o contrário daquilo que é. O que é verdadeiramente para Platão? As Formas. Pressuposto: o sofista concebe aquilo que não são as essências reais do inteligível, concebe o seu contrário, mas o Outro não significa o «contrário» daquilo que «é». Conclusão: nesta passagem não se pode admitir o falso como Forma, pois de acordo com a passagem 257c e 258b, o Outro não significa nem contrariedade nem o contrário daquilo a que se poderia supor como sendo seu contrário. Ver Sof. 257c: ‘não podemos, pois, admitir que a negação significa contrariedade’ e ‘esta oposição (de uma parte do Outro a uma parte do Ser) não é o contrário do ser o que ela exprime’ Sof. 258b_ o Outro não é o contrário daquilo que é verdadeiro (as Formas), assim não significaria o não-verdadeiro, portanto, também não significa o «falso». Não se pode confundir o Outro com o não-verdadeiro. Passagem Sof. 240d “Ao que crês, então são os não-seres, o que a opinião falsa concebe. A opinião falsa concebe os não-seres como sendo de algum modo. A opinião falsa concebe os não-seres como não sendo absolutamente o que é.” Pressuposto: a opinião falsa «concebe» o contrário daquilo que é. Conclusão nessa passagem não se pode admitir o falso como Forma, pois: o Outro não é o contrário, mas simplesmente algo de diferente. Cf. a passagem supra. Cordero traduz 240e por: Suponho que, da mesma maneira, um discurso falso será considerado falso se ele afirma que as coisas que são, não existem, e que as coisas que não existem, existem.’ Isto pode ser tomado como uma definição de opinião ou discurso falso e, repetimos, quando se faz uso «contrário» das coisas que existem e que não existem (nem tudo seria Forma, portanto) se está produzindo falsas imagens: fantasmós. Contudo o Outro não significa o «contrário» e não pode ser assim significado de «falso». O termo para «concebe» é derivado de doxa- doxa: «aparência» por oposição à «realidade» ou à «existência» essências; «opinião» por oposição à «ciência»; doxáζein: ter uma opinião por oposição a «saber». Cf. Lexique de la langue philosophique et religieuse de Platon. Édition «Les Belles Lettres». p. 144-146. Passagem Sof. 241a “Este discurso seria condenado por falso por dizer que os seres não são e os não-seres são. O sofista recusará pois considera os não-seres impensáveis e impronunciáveis, inexprrimíveis.” O sofista acusará a Teeteto e ao Estrangeiro de dizerem o contrário do que então diziam_ provavelmente referência a negação do não-ser por parte de Platão na República e no Teeteto, conforme comentário de Diès. Diès comenta que a fórmula «pensar ou dizer o falso», é pensar ou dizer o que não é, era uma fórmula corrente. Mas os sofistas que negam a possibilidade do erro negam também que se possa pensar ou dizer o não-ser. E o próprio Platão negou esta fórmula nos argumentos dialéticos da República 478b-c e do Teeteto 188 d-189b). Cf. Diès. Le Sophiste. p. 342. Nota de rodapé. Afirmação: ‘Há falsidade tanto nas opiniões como nos discursos.’ Conclusão nessa passagem não se pode admitir o falso como Forma, pois_ aqui no Sofista_ Platão toma outra direção e admite a existência do não-ser, outrora, na República e no Teeteto teria sido tomado como um discurso falso até mesmo por parte de Platão, já que também negava a possibilidade de «dizer» o não-ser tanto quanto os sofistas. Estrangeiro: Na verdade, isso nos leva a unir o ser e o não-ser a muitas fórmulas quando havíamos concordado na sua impossibilidade, a mais absoluta. Teet. Tua lembrança (República e Teeteto) é exata. Teeteto «recorda» o que foi dito nos diálogos anteriores, de fato, não é mais o caso, pois admitir a existência do não-ser não é (mais) a partir do Sofista, uma opinião falsa, não existe falsidade em se admitir que existe a opinião falsa, não é falso afirmar que existe o não-ser. E, o não-ser sendo uma Forma não é o mesmo que pensar ou dizer ou usar a fórmula «não é» pois aqui se estaria individualizando algo a partir do pensamento e do dizer, ao contrário quando se diz «não-ser» se diz «essência» e não nos parece que Platão estivesse colocando predicação entre as Formas, o predicar se dá a partir do pensamento e do discurso e não de uma essência, pois então não seria mais uma essência, mas um conceito e não podemos relegar a alma, importante mediadora das Formas para o pensamento e para o discurso, a um simples conceito. A falsidade se liga a todo instante dentro do texto à opinião e ao discurso, não se liga diretamente às Formas, o que quer dizer que Platão não pretendia colocar o falso como um dos elementos do inteligível. Passagem Sof. 241 d Discutir a tese de nosso pai Parmênides: em certo sentido o não-ser é e o ser não é. Pressuposto de uma das «fórmulas»: O não-ser é... “Há um ser do não-ser em toda a série dos gêneros, pois na verdade, em todos eles a natureza do outro faz cada um deles outro que não o ser e, por isso, mesmo, não-ser. Assim, universalmente, por esta relação, chamaremos a todos, corretamente, não-ser”. 256e O ser não é “o resto dos gêneros”. “é necessário afirmar que o próprio ser é outro que não o resto dos gêneros.” 257a Conclusão: se em toda série de gêneros há a natureza do Outro Se cada gênero é Outro que não o Ser Todos os gêneros são uma espécie de não-ser. Assim, se admitíssemos tanto o Outro como o Não-ser como uma Forma do falso teríamos que pela lógica da argumentação afirmar que todos os gêneros, inclusive os gêneros supremos, toda a ontologia de Platão conteria a falsidade através do Outro tido como falso. Platão diz que sem essa demonstração: o não-ser é e o ser não é, não se pode falar nem de discursos falsos, nem de opiniões falsas, nem de imagens, de cópias, de imitações ou de simulacros. Platão faz o terceiro pedido a Teeteto pois a contestação a que se lançaram sempre ultrapassaram suas forças e, “certamente, ainda ultrapassa”. Referindo-se à revisão de toda a tradição filosófica até então.[1]
Passagem sobre o Ser, o Repouso e o Movimento de onde se deriva o Mesmo e o Outro. Pressuposto: sendo assim, se o Outro concede a cada um dos três gêneros supremos sua mesmidade que o torna Outro através do Mesmo, que não os outros gêneros, e se admitirmos que o Outro é o falso como forma, então teríamos que dizer que todos seriam falsos em relação ao outros que restam desde que é Outro em relação aos outros dois. Não é outro. É outro. 256c-d Se a Forma do Outro é o falso, segue-se que quando Platão diz que o Movimento é outro, então ter-se-ia que dizer que o Movimento é falso. Ele não é outro= ele não é falso. O Movimento é outro que não o ser. O movimento é não ser, teria que ser falso como essência.
Seria preciso identificar as várias funções do Outro e do não-ser em todas as passagens do diálogo.
[1] Parmênides e todos que com ele concordaram contam fábulas mithos. Longa passagem sobre o pensamento dos Filhos da Terra, Amigos das Formas e Parmênides. Abordagem sobre o Ser: aporia de todas teses. Crítica ao ser absoluto de Parm. Em 244e. Platão chega à conclusão que o Todo de Parmênides possui partes. Após a revisão inicia a passagem sobre a comunidade dos gêneros onde a dialética é colocada como ciência suprema que permite ao novato, pretendente à sabedoria, distinguir onde há acordo e onde há desacordo no pensamento sobre as Formas que podem se unir e as que não se unem, como no caso do Repouso e do Movimento: comunidade dos gêneros. A participação das Formas implicaria em que se possa perceber a diferença das coisas que devem se unir e daquelas que não devem se unir quando se pensa e se diz algo. Essa diferença deve ser buscada a partir da participação da ciência suprema. Ainda, Platão coloca nesta passagem 253d uma definição de discurso falso por meio mesmo do mau uso da dialética quando ele diz: não tomar por outra uma forma que é a mesma, nem pela mesma uma forma que é outra, obra da ciência dialética. Quando se faz o contrário disso se está produzindo outra coisa que o discurso do verdadeiro filósofo, pode-se dizer, está-se produzindo o discurso dos sofistas, o falso discurso. Logo, se há uma ciência para conduzir ao verdadeiro logos e a saber o que as Formas realmente são, fica claro que o não uso da dialética conduz por outro caminho: o caminho do erro e da falsidade, que não fazem parte da ciência suprema, aqui no Sofista uma orientação através do discurso para apontar quais os que são mutuamente concordes e quais os que não são. [... análise não continuada]
2003 filos by sandra