quarta-feira, 5 de outubro de 2005

Os gregos é que tinham razão...

Primeiro passo para o ato de filosofar, a admiração?, não, o "nada em excesso".
..."nada em excesso"_ foi a melhor criação de toda a história da filosofia, pois, uma admiração excessiva nos torna ou delirantes ou perguntantes "demais" e com respostas não-encontradas, também em excesso, acabaremos afogados no rio heraclítico invertido mais perigoso: numa margem, as perguntas, na outra, respostas possíveis, mas, a Vida não está em nenhuma das margens, está à frente, pecamos portanto, sempre pelas bordas.
Então, mais uma dose de excesso que vem pela margem esquerda e alternando-se com a margem direita, acaba mesmo, em excesso de nadismos-flutuantes.
Anna K. cansou da Filosofia, quando acabar de postar todos os textos antigos, tomará outro rumo. Qual seria?_ de novo uma pergunta?, não tomas jeito mesmo!
Se ‘admirar é despertar para uma nova realidade’, que se abre diante do nosso ser, admirar pressupõe, então, compreender um novo modo de se olhar para as coisas, como se fosse a primeira vez em que o estivéssemos fazendo, ou quem sabe, o caminho para admirarmos algo, seja exatamente o contrário: não ver uma primeira vez, mas uma segunda, uma terceira... ver infinitamente uma mesma coisa enquanto ela continua a desvelar-se para o nosso ser e para o nosso pensamento. Esta realidade que se abre — leia-se realidade como o aparente e também como o não-aparente/essência — não será nunca ‘toda uma realidade’, mas apenas parte dela, pois torna-se impossível apreender toda a essência de alguma coisa e de todas as coisas. Isto leva a um processo de angústia: estamos diante do devir contínuo porque sempre depois de uma terceira/última vez, haverá uma quarta/última vez e assim continuamente. Despertar para a admiração converte-se em um processo infinito e finito: infinito, porque o ‘ser que se mostra’ é inesgotável, não tem fim mesmo quando deixamos de admirá-lo, também não vivemos o tempo necessário para nos satisfazermos com o contínuo admirar da essência de outros seres\entes, talvez este tempo necessário não exista; finito, se deixarmos de admirar, se nos colocarmos numa postura dogmática diante do já descoberto: são as afirmações constantes dos filósofos de carteirinha. Mas, inclusive as coisas já descobertas, o tão e sempre mesmo-mesmo, pode vir a ocultar vários véus (des-velamento), depende do desejo de querermos continuar retirando véu por véu, sensação por sensação, admiração por admiração, palavra por palavra, conhecimento por conhecimento. Às vezes, nos deparamos admirando algo que esteve ao nosso lado, durante todo o tempo até então já vivido e percebemos que o que ali sempre esteve, também não esteve. Por que não queríamos ou não podíamos perceber?, então este algo novo/antigo começa a fazer parte de nossa memória e é como se ele estivesse estado presente todo o tempo, passamos a senti-lo como se sempre tivesse existido dentro de nós. Mas será mesmo assim?, ou não queremos aceitar o tempo que foi deixado para trás, o tempo de não ter admirado? Qual é a sensação de percebermos que não havíamos percebido algo que finalmente se mostra? Então surge a pré-ocupação com o tempo, não apreendemos as coisas, porque nos comportamos como se fossemos imortais e tivéssemos a nossa frente todo o tempo do mundo para conhecê-lo, mas o mundo é rápido e o tempo também, ‘a matemática da vida não é fácil, cada vez que somamos mais um dia na nossa existência, diminuímos outro daqueles que nos restam para viver’, e no entanto, sequer percebemos que a vida é assim, nos enterramos num ir e vir pragmático como se isto não acontecesse para cada ser humano, como se o nosso tempo aqui, diante do mundo, é que fosse infinito. Quem sabe queremos ter a pretensão de deslocar o infinito do lugar a que pertence?, mas o que temos é o agora, que também não é nada, pois se esvai ao lado da transitoriedade do tempo. Mas o tempo não é somente um agora partindo constantemente, podemos conservar o nosso tempo interno através da memória. Então vem outra interrogação: será que as realidades que se abrem para nós, nestes instantes em que o tempo da memória não importa, não estão guardadas no nosso pensamento para se revelarem algum dia? Até que ponto o que eu vejo não saiu exclusivamente da essência do que sou? Até que ponto aquilo que eu percebo não é produto do meu imaginário, simplesmente adequado à realidade, enquanto exterioridade convencional do mundo?, das coisas?, inclusive do que posso sentir e do que não devo sentir? O que é o meu tempo?, o meu mundo apreendido?, o que são minhas memórias?, o que pode ser a ação do meu imaginário?, o que é tudo aquilo que eu sinto, vejo, penso, escrevo, vivo?, diante dos véus que o mundo vai desvelando diante do que sou e do que poderei vir a ser?
Anna Karenina diz: não tenho resposta para nada disso. Que alívio, tornaria a Vida muito linear e tediante. Os sistemas brigam entre si e rondam o tédio com a possibilidade de convencer o mundo que este funciona como pregam tais sistemas. Que perigo! Quanto mais sistema mais tédio? Quanto mais tédio mais sistema? Ainda bem que o mundo é cauteloso e ainda não se decidiu nem por este nem por aquele nem nada não... nada em excesso.